“Vou sair em breve”, afirmou Nini Satar

–“Não sei porque estou detido. Não fiz nada. Meti um recurso. Vou sair em breve”, afirmações de Nini aos agentes penitenciários à entrada da cela especial na BO

Quarta-feira, 01 de Agosto de 2018. Tarde quente em Maputo. Trinta e quatro graus centígrados. O céu está totalmente aberto. Agitação no Aeroporto Internacional de Mavalane. É o regresso do criminoso mais procurado do país. Nini Satar chega sem honra nem glória. Sob fortes medidas de segurança, o todo-poderoso, com tentáculos em quase todos os sectores, agora está no encalço dos homens do sistema da Justiça que ele próprio ultrajou.

Mas é preciso notar que Nini Satar tem sido um “mestre” em manipular os vários órgãos de justiça e, em função disso e de muitas cartas que provavelmente terá em mãos, será interessante ver qual deles vai jogar por forma a complicar o sector judicial.

Nini Satar aterrava no Aeroporto Internacional de Maputo pouco depois das 14 horas, transportado no voo kp 740 da Kenya Airways, vindo directamente de Nairobi, depois de, na noite de terça-feira, ter sido extraditado num voo da Tailândia para Quénia.

Ao que o SAVANA apurou, Satar era acompanhado por dois moçambicanos, identificados por David David e Wilson Nguane, que se acredita sejam agentes de segurança enviados à Tailândia para receber o criminoso condenado em Tribunal por envolvimento no assassinato do jornalista Carlos Cardoso.

Nini foi imediatamente conduzido à Penitenciária de Máxima Segurança, vulgo B.O., sob fortes medidas de segurança.

O Jornal soube que, na tarde em que Nini chegou à B.O., houve um recolher obrigatório para os reclusos ali encarcerados. Um aparato de segurança fora do comum foi montado no local.

Na Penitenciária da Máxima Segurança, uma casa que bem conhece, em virtude de ter passado cerca de 12 dos 13 anos que cumpriu no “caso Carlos Cardoso”, Nini vai inaugurar uma nova cela, concebida para criminosos tidos como altamente perigosos.

Trata-se duma cela com um sistema de segurança digital, equipado com câmaras de segurança e com vigilância 24 horas por dia. A nova cela inclui um sistema para banho de sol, o que significa que Nini não sairá da cela para tomar o chamado banho do sol, bastando abrir o pequeno sunnroof na cobertura.

Reportam-nos as nossas fontes da B.O. que Nini chegou, aparentemente, relaxado e, dirigindo-se aos agentes penitenciários, teria dito que não sabia por que estava ali porque nada de mal fez. “Hei-de sair em breve”, terá garantido o criminoso com fortes tentáculos no sistema da Justiça, onde alguns oficiais ficaram com cheques sem cobertura emitidos por Nini, em nome de alguns estabelecimentos comerciais da praça.

SAVANA está na posse de nomes de alguns oficiais que tiveram de engolir a máfia por não terem onde reclamar cheques recebidos em esquemas comprometedores, que incluem jornalistas. Na sua chegada, Nini teria garantido ainda que submeteu um recurso contra a revogação da liberdade condicional ao Tribunal. Recorde-se que a liberdade condicional de Nini Satar foi assinada pelo juiz Adérito Mahlope, da 10ª secção do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo. Para o juiz, foi determinante o bom comportamento (era responsável da biblioteca e da Mesquina na BO), contra todos os protestos da Procuradoria Geral da República.

Agitação em Mavalane

A mega-operação de recepção de Nini, no Aeroporto Internacional de Maputo, foi feita ao detalhe, envolvendo um forte aparato de segurança, num cenário que lembra filmes de terror.

Até cerca das 12h: 20 minutos, quando acampámos no local, já eram visíveis os sempre disfarçados agentes dos serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE).

Uma hora depois, as 13h e 20 min, começam a chegar outras equipas de jornalistas de diversos órgãos de comunicação social, entre nacionais e internacionais, que querem documentar a chegada de Sahime Mohammad Aslam, o nome pelo qual Nini Satar se fazia passar quando foi preso a 25 de Julho último no Reino da Tailândia.

14h, uma viatura de guerra, os vulgos BTR, estaciona no parque situado ao lado esquerdo à entrada do Aeroporto.

14h: 10 min, duas viaturas de transporte de reclusos, vulgarmente conhecidas por celulares, entram escoltadas por duas outras mahindras, todas do Serviço Nacional Penitenciário (SERNAP), com agentes fortemente armados, chegam ao local. Os repórteres de imagem ligam as câmaras e as máquinas fotográficas, começam a registar o momento até que um oficial com ares de chefia irrompe ao meio.

“Estão a gravar o quê”, vai perguntar, visivelmente, nervoso. Os jornalistas estão habituados a tais ossos de ofício, por isso, dão pouca atenção ao “buffo”, até que desiste das ameaças. Era parte de um expediente para evitar que a imprensa registasse o momento.

De repente, de cinco viaturas civis saem 13 agentes do Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC) à paisana, embora alguns envergando colectes à prova de bala e empunhando armados de fogo.

Aproxima-se a hora para a aterragem do homem das “quantias irrisórias” ao país de onde, mau grado uma Justiça sui generes, não devia nunca ter saído.

Agitação total no aeroporto. Trabalhadores abandonam seus afazeres para testemunhar a chegada do criminoso mais procurado do país.

Duas viaturas da Polícia da República de Moçambique (PRM), uma Hyundai e outra Hardbody e uma viatura de guerra da Unidade de Intervenção Rápida (UIR) seguem para a pista do Terminal Internacional.

14h e 25 min ouve-se sirene do lado de fora de Aeroporto. Desespero para a classe jornalística que já se apercebeu do plano de despiste das autoridades. “Já saíram. Estão ai. Já se foram”, grita um.

Falso alarme. Eram mais duas mahindras do SERNAP, um celular e outro de escolta, que entravam no Aeroporto para se juntar à equipa.

Já são 14h:28 min. O oficial que minutos antes se enervara com a presença da imprensa vem informar que a escolta de Nini já saiu do Aeroporto. Mais um expediente para abandonarmos o local.

“Aos jornalistas, quero dar uma informação útil: as 16h:30 min no SERNIC terão toda a informação”, diz.

A notícia é mal recebida pelos profissionais da pena. “Mesmo aqueles que o prenderam (Nini) mostraram-no. Agora, nós que somos simples receptores é que andamos a escondê-lo”, desabafa um jornalista com fortes influências no sistema da Justiça, desta vez, visivelmente indignado.

Mas as movimentações no Aeroporto Internacional de Maputo continuam a sugerir que “Sahime” ainda está no local, onde os agentes dos serviços secretos continuam às sondagens.

Várias viaturas com vidros fumados, desses que a Polícia combate, também estão em movimentações dentro do Aeroporto de Mavalane, transportando agentes da própria corporação à paisana. Algumas ostentam chapas de inscrição fictícias, daquelas que as gangs criminosas usam nas suas incursões. Outras nem matrícula têm.

14h:38 min, os 13 agentes à paisana entram nas quatro viaturas civis, duas altezas, uma Runex e um Fun Cargo. Perfilam, juntamente, com uma Hyundai e um Hardbody da PRM, próximo da entrada que dá acesso à pista.

O relógio não pára de contar. Já são 14h:54 min. Um grupo de trabalhadores duma empresa de limpeza afecta ao Aeroporto sobressai da entrada que dá acesso à pista. Interpelamos o primeiro para atestar a versão de que a escolta de Nini já havia partido.

“Esses homens ainda estão lá dentro”, perguntamos, depois de nos apresentarmos. “Não sei”, responde, claramente para evitar se envolver em “problemas com jornalistas”.

Não desistimos. Interpelamos o segundo. “Ainda não saíram. Estão lá”, responde. “Estão na pista internacional”, responde uma outra funcionária.

São notícias que contradizem o oficial e confirmam a estratégia de despiste das autoridades, mas que sobretudo renova as esperanças da classe.

Mas também confirmava-se o equívoco dos apressados repórteres televisivos que, nos habituais show offs de semi-directos, já tinham dado como certa a saída do criminoso, faltando apenas, diziam eles, saber em que viatura Nini havia sido transportado.

Enganados também estavam os repórteres que cedo abandonaram o local, convencidos com a primeira verdade dada pelos oficiais.

“De qualquer das formas, aqui há uma tentativa de despiste muito forte”, sublinha um colega.

15h: 11 min, volta a se ouvir sirenes. Agora é sério, está a sair a tão aguardada escolta. Compreende a Yundai e o Harbody da PRM, as viaturas celulares do SERNAP, o BTR da UIR e as viaturas civis, que saem a velocidade de cruzeiro. Maldita horam em que o Fun Cargo branco que transporta agentes à paisana nega arrancar. O condutor vai abrir o “campom” e acerta o que a distância não nos permite visualizar. Finalmente vai arrancar a viatura ligeira.

A escolta está a sair em contra mão pela entrada do Aeroporto. De repente o Código de Estrada foi suspenso e deu lugar ao Código Militar. As viaturas particulares, que perfilam nas cancelas da entrada do Aeroporto, devem encostar para dar lugar a um delinquente por tendência.

Assim que saem, as viaturas se dividem, havendo as que seguem pela Avenida Acordos de Lusaka e outras seguem o Largo da Deta, o troço que liga o Aeroporto à avenida de Angola. Não se sabe se ainda é a estratégia de despiste.

Assim foi no dia que chegou o criminoso mais procurado do país.

Patética SERNICNini Satar

Mais de uma hora depois, o SERNIC dava uma patética conferência de imprensa, praticamente, para dizer nada. O porta-voz do órgão, Leonardo Simbine, foi quem desempenhou o ingrato papel de dizer aos jornalistas o que já sabiam.

Disse que o arguido tinha chegado ao país, que foi preso em cumprimento de um mandado de captura internacional na sequência da revogação da liberdade condicional por ter violado certas obrigações, que é indiciado na prática de outros crimes cometidos durante a vigência da liberdade condicional e que usava um passaporte falso.

Confrontando sobre por que não Nini não foi exibido a imprensa, contrariando a prática da corporação, o porta-voz socorreu-se de questões de segurança.

Face às insistências dos jornalistas, respondeu: “o que vos posso assegurar é que o senhor Momade Assif, mais conhecido por Nini Satar, encontra-se em território moçambicano, como disse, por questões de segurança”.

Fez saber que os processos que estão em curso na procuradoria da cidade estão relacionados com associação para delinquir, roubos e raptos em que Nini é indiciado como autor moral.

Sobre o possível julgamento de Nini na África do Sul, onde também é indiciado na prática de raptos, Leonardo Simbine disse que só depois de se ter comunicação oficial é que se pode tomar os passos seguintes.

Quanto às circunstâncias em que foi detido na Tailandia, Simbine disse que há informações sigilosas que não podia avançar. Confirma que o arguido passou por vários países, mas sublinhou que o caso ainda está em investigação, incluindo as circunstâncias em que obteve o passaporte falso.

Tailândia não será base para criminosos

Nini foi detido a 25 de Julho último na Tailândia. Falando numa conferência de imprensa, no domingo, o vice-comissário da Polícia tailandesa de Turismo, Pol Hakpan, disse que Nini foi preso num hotel em Thonglor, em Bangkok.

“Ele não mostrou o passaporte quando perguntado pela polícia, mas a sua aparência coincidia com a de Momade Assif Abdul Satar, como mostrado no alerta vermelho da Interpol”, informou Hakpan, citado pelo bangkokpost, um jornal editado na Tailândia.

As suas impressões digitais foram enviadas para o Instituto de Medicina Forense para exame e foi confirmado que ele é Momade Assif Abdul Satar. Investigações posteriores revelaram que Nini permaneceu na Tailândia por três anos. Foi inicialmente acusado de violar a Lei de Imigração e teve seu visto de entrada revogado.

Nini fica permanentemente banido de voltar a entrar na Tailândia. Segundo Surachate, o criminoso tentou subornar a Polícia tailandesa quando foi preso.

Num curto vídeo feito pela Policia turística da Tailândia, reconhece usar um passaporte falso. Visivelmente desesperado, o homem que, a partir do exterior desafiou a tudo e todos, suplica as autoridades policiais para acreditarem nele, argumentando que as informações contra ele em Moçambique são totalmente falsas e prometendo fornecer toda a sua documentação.

Ao confirmar a extradição, o major general disse que a Tailândia não será base para criminosos estrangeiros.

“Não vamos permitir que criminosos estrangeiros usem a Tailândia como base para suas operações”, sublinhou. Nini volta a casa depois para retomar a pena de prisão de 24 anos a que foi condenado pelo assassinado do jornalista Carlos Cardoso, depois de ter cumprido 13 anos.

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