Analistas acusam Governo de má gestão e de criar espaço para agudizar greves que têm sacudido a função pública. Executivo e FMI acordaram, recentemente, cortes no décimo terceiro salário da função pública até 2028.
Numa altura de sucessivas greves na função pública moçambicana, nomeadamente de juízes, procuradores, médicos, profissionais de saúde e professores, o Executivo e o Fundo Monetário Internacional (FMI) anunciaram, na semana passada, cortes no décimo terceiro salário até 2028.
Alguns funcionários públicos não têm dúvidas de que a medida vai enfraquecer o já debilitado orçamento nas famílias.
Aos microfones da DW, os cidadãos dão conta das dificuldades do dia-a-dia, numa altura em que se queixam da subida dos preços. “Oito mil [meticais] não faz um rancho completo numa casa. Só dão mesmo para comprar um saco de arroz ou óleo”, afirma uma cidadã ouvida pela DW.
Também nas ruas de Maputo, outra cidadã conta à DW que, por causa dos preços, só tem comprado “um litro de óleo”. Diz também que passou a comprar menos cebolas, pois “estão caras”.
Desde a aprovação da Tabela Salarial Única (TSU), em 2022, que os funcionários do Estado andam descontentes com o executivo de Filipe Nyusi. Desde então, houve uma sucessão de greves.
Em entrevista à DW, o pesquisador Borges Nhamirre aponta a “incapacidade” do Governo moçambicano na mobilização de fundos como fator do problema, e por isso, diz, “estamos numa situação de quase colapso na administração pública”.
A quem beneficiou a TSU?
Aquando da implementação da TSU, a ideia era melhorar a vida dos funcionários, explicou o Governo na altura. No entanto, a economista Estrela Charles aponta os altos quadros do Estado como os maiores despesistas.
“Significa que essa TSU não beneficiou a estes funcionários, então a quem beneficiou? Quando falamos de excesso de orçamento, de despesas de salários e remunerações, a quem beneficiam? Quem são os funcionários que gastam boa parte dos salários e remunerações?”, questionou a economista.
Governo não se posiciona sobre funcionários-fantasma
Entretanto, foi descoberto um esquema de 500 “funcionários-fantasma” que alegadamente enriquece algumas pessoas. Um assunto sobre o qual, nota Estrela Charles, o Governo “não se posicionou de forma clara”.
“Nós ouvimos o Governo a dizer sempre que reduziu os funcionários-fantasma, que está a combater, mas não existe nenhum relatório que diga que estes funcionários-fantasma reduziram a massa salarial em tanto”, acrescenta a economista moçambicana.
O pesquisador Borges Nhamirre diz não fazer sentido que haja falta de dinheiro na função pública, até porque “o assunto não é financeiro, mas é como é que devem ser alocadas ou distribuídas as poucas finanças que se tem. Este país tem dinheiro para realizar determinadas coisas”, afirmou.
Problema de gestão
O FMI alertou em maio passado que o “excesso de despesa pública” de Moçambique, sobretudo os salários, poderiam colocar em causa o programa que a instituição havia acordado com o país lusófono.
A economista Estrela Charles culpa o Governo no que toca à gestão das finanças públicas, pois, diz, foca-se mais nas despesas do que nas receitas.
“Acho que o Governo está a lutar pelo lado errado, porque está a lutar pelo lado das despesas quando devia focar-se nas receitas, não que não deva ter a questão da racionalização das despesas, é importante sim”, explica. (DW-IMN)