Silvina de Abreu, administradora do Banco de Moçambique e à data dos factos Directora do departamento de Relações Internacionais, Comunicação e Imagem na mesma instituição está a ser ouvida esta segunda-feira no julgamento do “caso dívidas ocultas”, no tribunal montado na Cadeia de Máxima Segurança da Machava.
No interrogatório que está a ser conduzido pelo Ministério Público, Silvina de Abreu reconheceu que teve pouco tempo para ler todo o expediente da contratação das dívidas.
“Eu guiei-me com o parecer que foi feito pela Drª Telma e pela sua assistente. O que fiz foi a reconfirmação. E fi-lo com celeridade”, reconheceu.
Silvina de Abreu refere que tratou o processo de forma célere, porque se tratava de um projecto de importância estratégica ligada à segurança do Estado.
Ana Sheila Marrengula quis saber dos documentos que a antiga directora leu.
“Eu recordo-me dos termos e condições de financiamento da ProÍndicus, porque não era um documento muito volumoso”, disse De Abreu, tendo acrescentado que houve vários motivos que levaram à aprovação dos pedidos de contratação de dívidas para os projectos da EMATUM e MAM.
“O facto de haver uma garantia soberana assinada pelo ministro das Finanças, Manuel Chang, fez-nos assumir que estava tudo legal. Fizemos o parecer positivo, porque consideramos o projecto de natureza estratégica e o próprio Estado apresentou garantias”, disse De Abreu.
Silvina de Abreu disse, igualmente, que a autorização do Banco de Moçambique era uma condição prévia, que constava dos termos e condições dos bancos internacionais que iam financiar o projecto.
A declarante disse que, para fazer os reembolsos ao Credit Suisse, as empresas já não precisariam de ir ao Banco de Moçambique e que o fariam nos Bancos Comerciais, e estes, por sua vez, partilhariam a informação através de um aplicativo com o banco central.
Silvina de Abreu diz que, ao abrigo do número 4 da Lei Cambial, não competia ao Banco de Moçambique aprovar os empréstimos que já tinham garantias do Estado.
“SOFREMOS PRESSÃO DE ANTÓNIO CARLOS DO ROSÁRIO”
Actualmente administradora no Banco Central, Silvina de Abreu disse em Tribunal, esta segunda-feira, que, durante a tramitação do expediente de contração de crédito para as empresas ProÍndicus, EMATUM e MAM, ela e a sua colega, que se encontrava também a trabalhar no processo de forma sigilosa, terão sofrido pressão por parte de António Carlos do Rosário.
“Ele estava impaciente e sempre que falasse sobre o processo destacava a questão da insegurança que o país estava a atravessar devido às incursões da Renamo no centro do país, sob orientação de Afonso Dhlakama, e dizia que, por isso, era urgente a aprovação do expediente, para poder garantir a segurança do país”, referiu.
A alegada pressão também foi mencionada pelas declarantes Joana Matsombe, Telma Gonçalves e Elsa Chambal ao longo das suas audições na semana passada.
Silvina de Abreu confirma que António Carlos do Rosário solicitou a retirada da referência da taxa de juro da carta, um pedido que, entretanto, não veio a ser atendido.
Em representação da Ordem dos Advogados de Moçambique, Filipe Sitoi perguntou à declarante se existe uma hierarquia funcional entre o Banco de Moçambique e o Ministério das Finanças, ao que Silvina de Abreu respondeu negativamente.
A assistente no julgamento também quis saber se De Abreu fez alguma pressão aos técnicos para dar pareceres positivos, ao que a declarante disse que não, “mas costumava ligar a pedir para acelerar o expediente por conta da pressão que também estava a sofrer”, disse.
Silvina de Abreu disse que não participou a pressão ao gabinete jurídico, mas colocou ao então administrador Waldemar de Sousa e ao Governador do Banco, Ernesto Gove. A declarante disse que não sabe se foi tomada alguma medida, mas reconhece que, a dada altura, às pressões pararam.
De Abreu diz que o parecer dado pelo Banco de Moçambique ao Governo foi com base na informação fornecida e que, na altura, o parecer positivo era o mais apropriado. Questionada se fosse chamada hoje a emitir um parecer, qual seria, Silvina de Abreu diz que poderia ser positivo, porque os projectos apresentados não tinham irregularidades.
“O campo de actuação do Banco de Moçambique era de natureza financeira, depois de o processo já ter passado por diversos intervenientes que já tinham aprovado”, referiu Silvina de Abreu.
Entretanto, a antiga directora do Departamento de Relações Internacionais, Comunicação e Imagem no Banco de Moçambique diz que, se tivesse trabalhado com menos pressão, sente que, eventualmente, poderia ter tomado uma decisão diferente em relação ao parecer sobre a contratação das dívidas.